Broken doll - Amanda Cass
Eu me perdi da minha alma há algum tempo.
Tenho para mim, que há muito tempo eu não sou mais eu.
Minha alma fugiu em algum momento quando estava distraída e já era tarde quando percebi.
Perplexa e confusa, eu a persigo por ai. Ando em busca de pistas, pegadas. Ponho-me em perigo, exponho-me, arrisco diante de qualquer vestígio de seu paradeiro, mas nada me dá indícios de que ela ainda habita em mim.
Não me sinto mais dona de mim, nem da minha casa, nem mesmo do meu querer. O querer perdeu-se com a alma minha.
Ela saiu sutil e discretamente. Desistiu de mim por certo, de tanto eu fazer concessões. Permissível, fui consentindo que meus desejos adormecessem e meu querer anestesiasse em prol do querer de outros.
Não foi por bondade, nem caridade. Apesar de hospedar um espírito pacífico, minha permissividade vem da indolência e de acomodação, mais que da benevolência.
Tenho a exata ciência disso.
Fui deixando de fazer as coisas que me davam alegria e que hoje nem sei mais se gosto.
Já faz tempo que não contemplo o nascer do sol, nem caminho por aí sem rumo, nem pedalo minha bicicleta sob o sol. Nem sei se ainda sei andar de bicicleta.
Tempo que não tomo um porre ou um grande sorvete, não danço, não canto bem alto no chuveiro, que não brinco de ser criança, que não aproveito de verdade a experiência de estar viva
Tempo faz que não sou muito, muito feliz, mesmo por alguns instantes, que não faço uma viagem, que não beijo com paixão, que não sou amimada só um pouquinho.
Essa nostalgia tem parecença com egoísmo, eu sei. Egocentrismo. Mas tenho a precisão urgente de ser contente um pouco, pois que os tempos de agora, são tão sem entusiasmo, que me apavora desgostar de vez de ficar viva.
Preciso achar a “ânima”.
Deve ela estar escondida cá em mim, pois que uma alma não há que deixar um corpo que ainda vive. Isso é certo!
Escarafuncho na minha memória o momento que a “vi” pela última vez, mas não me vem à lembrança. Presumo que tenha ficado lá atrás com minhas bonequinhas da infância ou entre os cadernos de adolescência, ou no primeiro dia de aula, ou quem sabe no primeiro beijo de amor. Mas a gente tem mania de apurar lembranças, só para ter ilusão de que já foi feliz, mesmo sem ter sido.
Sei que é a investigação mais solitária da minha existência. Um momento especialmente nevrálgico
Não há como obter ajuda para encontrar a alma que está dentro de mim.
Quem mais poderia dela saber? Supondo que a encontre, como resgatá-la?
Qual a isca que se usa para atrair e capturar uma alma fugidia?