quinta-feira, 19 de março de 2009

Às filhas

Eu li um texto insuperável num blog maravilhoso, chamado "linhas ao vento". Não há como ignorar o que lá estava, quão tocante se fez dentro de mim. A autora, diga-se de passagem, primorosa em sua técnica de escrita, é dona de uma percepção feminina e humana tão fantástica, que seus escritos chegam a ter cheiro, sabor, textura, sons, música e poesia, muita poesia... Conheço poucos que envolvem assim. Descobri ou fui descoberta por ela, não sei ao certo, por um desses acasos que a surpreendente existência nos presenteia. Como gostaria de escrever assim. Glória. Outro nome não poderia. O texto, uma crônica, era sobre a perda precoce da filha, o que foi delineado tão delicadamente, um filigrana, que quase me diluí com um tanto de dor e outro tanto de amor. Emoções que a primeira vista podem parecer piegas, mas não... Não... Nada havia de pequeno no que ela escreveu e no que senti. Misturei meus sentimentos de ser mãe de uma menina com os sentimentos da mãe que perdeu a possibilidade de viver com a sua. Doeu as duas coisas. Parece que nas mulheres o simples estar viva dói... Me fez pensar. Especulei que me embeveço pouco com minha menina, que ando ausente e brincamos muito pouco com as bonequinhas de pano e os bebês de plástico. Quase não fizemos comidinhas e tomamos tão poucos cafés de mentirinha. Vestimos poucas fantasias de princesas. Fantoche sou eu no dia-a-dia, deixando-me manipular pela rotina voraz, esquecendo-me de olhar de perto minha menina, que está sempre comigo mas nem sempre estou com ela. Viajando no meu próprio turbilhão mental, nos confusos exercícios de aprender a viver, desapercebi a criaturinha crescendo. Hoje em dia chora muito... Pré adolescência... Os seios dando sinais de que o mundo já não é mais um parquinho, e o corpo já não é de criança... Como feito nascer de novo,de outro ovo. Feito nascer de novo uma outra pessoa. Brinquei de menos com a menininha, e a mocinha que desabrocha, não quer mais brincar comigo. Foi você, minha pequena, quem de nós duas fez casinhas de papelão, encheu de bonequinhas de papel, para brincar comigo de família. Eu quase nunca encontrava tempo. Dispensou as casas coloridas e caras e as bonecas com cílios e cabelos longos que eu lhe comprava, pra ficar horas recortando caixas de sapatos para criar seu universo de papel... Ler o texto sangrado da Glória me fez repensar na sagrada relíquia, o precioso tempo que ainda temos, entre suas lágrimas hormonais, tendo um pé em suas sapatilhas de princesa e outro pé no salto alto. Menininha mulher, metade boneca, metade feroz, não faço certeza de dar conta do que fora do meu controle se encontra, mas me aponta um caminho. Teço ainda um pouco de você como uma teia, mas falta costurar em mim sua alminha solta de renda. Farei isso com apenas um fio, pois não te quero presa, apenas protegida. Eu só te quero viva e caminhando ao meu lado. Quero eu caminhar ao seu e agradecer ao Universo por ter vingado.

4 comentários:

Anjuh disse...

Gostei de seu modo de pensar....parabens...

Solange Maia disse...

Que delícia !!!
Seu texto me fez o que o texto da Gloria fez com você.
Eis uma "corrente" do bem, eis a preciosidade que as surpresas da vida nos reservam.

Nem sei como vim parar aqui, mas ganhei o dia !!!

Salve, salve !!!

Estou indo agora brincar com minha filha e seus nenéns de plástico....

Amei seu blog !!!!

Parabéns !!!!!

Vou visitar o da Glória também....

Obrigadaaaaaaaaaaaaaaa.........

Beijo carinhoso,

Solange



Quando der passe lá no meu cantinho :

http://eucaliptosnajanela.blogspot.com

j. monge disse...

Amo os filhos que não tenho através dos filhos dos outros.

Obrigado por me fazerem sentir isso.

Beijo!

Silvestre Gavinha disse...

Oi Rossana, vim aqui conhecer você e agradecer sua visita ao Gavinhas.
Encontrei essa maravilha!
A mágica da reciprocidade.
Amei seu blog.
Tua poesia.
Senti-me mais honrada pela visita.
Obrigada
Marie